Agricultura e construção puxam investimentos
Alta das commodities e juros baixos explicam desempenhos de 2019 a 2021, diz estudo
Por Lucianne Carneiro
A agricultura e a construção puxaram o crescimento dos investimentos entre 2019 e 2021 no país. Estudo exclusivo do Centro de Estudos de Mercado de Capitais da Fipe (Cemec- Fipe) aponta que os dois segmentos responderam por dois terços do aumento da produção de bens de capital na passagem entre 2019 e 2021, um período em que o país enfrentou o primeiro ano da pandemia, a recuperação após o auge da crise no início da crise sanitária e a desaceleração dessa retomada ao longo do ano passado. A concentração ajuda a explicar a expansão dos investimentos mesmo em um contexto macroeconômico desfavorável, explica o coordenador do Cemec-Fipe e responsável pelo estudo, Carlos Antonio Rocca.
“Alguns fatores importantes para a decisão de investimento não são animadores. A recuperação da economia perdeu velocidade, a expectativa de crescimento para os próximos três anos é a mais baixa desde 2006 e também temos incerteza”, diz ele, apontando a influência desses setores. “Mas fomos investigar quem puxou esse aumento de investimentos e vimos que isso veio principalmente da agricultura, com o bom desempenho das commodities, e da construção, com as taxas de juros ainda relativamente baixas.”
A ideia do estudo partiu da avaliação de que o crescimento dos investimentos no período foi “de certo modo surpreendente”, já que o país tem níveis elevados de capacidade ociosa, há uma redução continuada das expectativas de crescimento para os próximos anos e a incerteza permanece elevada, destaca Rocca.
Pelos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de investimentos foi de 15,5% do PIB em 2019 para 16,6% do PIB em 2020 e 19,2% do PIB em 2021. O estudo do Cemec-Fipe isola 2020 para evitar efeitos específicos do primeiro ano da pandemia e compara diretamente a variação entre 2019 e 2021.
Para entender a origem dessa expansão do investimento, no entanto, Rocca já leva em consideração trabalho realizado pelo economista Gilberto Borça Jr. e publicado em artigo no Valor e no blog do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) que mostra que a taxa de investimento na verdade passou de 16,2% do PIB em 2019 para 18,2% do PIB em 2021.
Isso porque ele desconta dois fatores que afetaram os investimentos no período. O primeiro é a mudança dos preços relativos entre os bens de capital que compõem a FBCF e os de bens de serviços que compõem o PIB, pelo aumento do câmbio, que afeta os bens de capital importados. Já o segundo é o impacto do valor das plataformas da Petrobras. Uma mudança tributária (com o fim do Repetro, regime aduaneiro especial que facilitava a importação de bens destinados à exploração de petróleo) fez com que o investimento fosse puxado pela importação de bens de capital em período recente.
“Ainda assim foi uma alta grande dos investimentos, de dois pontos percentuais. E quando se olha os dados da FBCF entre 2019 e 2021, vemos que o destaque são as máquinas e equipamentos e a construção. A partir daí, olhamos a produção de máquinas e equipamentos, e vimos esse peso grande daquelas ligadas ao setor agrícola e à construção”, afirma o coordenador do Cemec-Fipe.
Considerando o índice de produção física de bens de capital, do IBGE, o aumento entre 2019 e 2021 dos segmentos voltados para a agricultura ficou acima dos 40%, em termos reais (43,8% nos agrícolas e 47,8% nas peças agrícolas). Já os bens de capital para construção avançaram 40,48%, na mesma base de comparação.
Assim, pelas contas do Cemec-Fipe, o índice de produção de bens de capital avançou 14,8% entre 2019 e 2021. Desse aumento, 6,44 pontos percentuais vieram do segmento agrícola e 0,91 ponto percentual de peças agrícolas, somando 7,35 pontos percentuais, ou quase metade (49,7%) do crescimento. Já os bens de capital para construção são 2,47 pontos percentuais, ou 16,7% da expansão. O peso é muito maior que os segmentos de bens de capital para fins industriais (apenas 1,01 ponto percentual), por exemplo.
“Se somar o segmento agrícola com o de peças agrícolas, praticamente 50% se referem a máquinas para o setor agrícola. Incluindo a construção, são dois terços dos investimentos que vêm desses dois segmentos”, reforça Rocca. Além de avaliar as causas por trás da alta do investimento, o estudo também levanta os dados de investimentos de 472 empresas de capital aberto e aponta que as companhias ligadas a agricultura tiveram expansão de 52% do indicador de FBCF entre o fim de 2019 e o terceiro trimestre de 2021. O ritmo foi bem superior ao de 24% registrado para a média das empresas com capital aberto como um todo. A medida de investimento neste caso considera a evolução do valor dos ativos nas demonstrações financeiras, tanto os imobilizados (como imóveis e máquinas) quanto os intangíveis (sistemas e softwares, por exemplo), em valores nominais.
“As empresas relacionadas ao agronegócio tiveram expansão muito maior dos investimentos que a média da amostra. Isso reforça os dados do crescimento expressivo das máquinas agrícolas. As empresas abertas têm um peso grande na economia, têm um quarto do valor adicionado, e mostram uma tendência geral”, nota o coordenador do Cemec-Fipe.